quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Refluxo na infância

Preocupação ou Modismo?



Dentre as perguntas mais frequentes que ouço no consultório, está o porquê do aumento da incidência de Refluxo Gastroesofágico nos dias de hoje. De tempos em tempos, alguma doença infantil vira tendência, não só em rodas de conversas de pais, como na busca pelo atendimento pediátrico, levando à sensação de que todas as crianças sofrem do mesmo problema e precisam de tratamentos idênticos. É essa a vez do refluxo ser considerado vilão em várias alterações sofridas pelas crianças, mesmo que em nada alterem seu desenvolvimento.
O grande problema disso é quando tratamentos são iniciados por orientação de vizinhos, amigos e familiares, sem avaliação médica, e desnecessários.
Metade das crianças saudáveis, de 2 a 8 meses de idade, regurgitam duas ou mais vezes ao dia. Este Refluxo Gastroesofágico fisiológico (RGE) ou Regurgitação Infantil (RI), de amadurecimento, resolve espontaneamente em 90 % dos casos, até os dois anos de idade.
A regurgitação infantil acontece porque a válvula entre o esôfago e o estômago (esfíncter esofagiano), ainda está se desenvolvendo. Normalmente, após a passagem do leite, ele fecha e segura o líquido. Com a imaturidade, o esfíncter relaxa e não fecha como deveria. Por isso, o retorno de um pouco de leite após a mamada, quando o bebê arrota, ou mesmo um tempo depois em forma de “queijinho” é normal. Ela também ocorre porque nem sempre é possível notar que o bebê mamou em excesso. Nesse caso, até um arroto mais intenso traz o líquido de volta. Regurgitar não tem nenhuma conseqüência para o bebê e não causa desconforto.
Em poucos casos, existem outras manifestações adicionais à regurgitação, que requerem maior investigação e tratamento, por haver lesões associadas. Nestes casos existe o que chamamos de Doença do Refluxo Gastro-esofágico (DRGE). Deve ser suspeitada na presença de irritabilidade, sono agitado, recusa alimentar, falta de crescimento, perda de peso, soluços excessivos, anemia por deficiência de ferro, manifestações respiratórias (engasgos, sufocação, tosse, estridor, asma, infecções respiratórias de repetição).
O diagnóstico é predominantemente clínico, devendo ser avaliado pelas alterações apresentadas por cada criança. Em alguns casos podemos abrir mão de exames que nos auxiliam nos casos mais graves, ficando a critério do Pediatra a sua solicitação, caso a caso. São eles a seriografia (radiografia contrastada), que avalia deglutição, esvaziamento gástrico e alterações anatômicas do esôfago, do estômago e duodeno; a Cintilografia, que avalia refluxos não-ácidos, esvaziamento gástrico e aspiração pulmonar; Endoscopia Digestiva Alta, que visualiza lesões diretas (esofagite) e lesões microscópicas por biópsia; Manometria e pHmetria, que avaliam tonicidade de esfíncter e presença de conteúdo ácido no esôfago, respectivamente, utilizados para acompanhar casos mais graves. Tem sido muito utilizado a Ultrassonografia para avaliação do RGE, que apenas notifica a presença dele, não sendo um exame diagnóstico que faça diferença no acompanhamento clínico.
O principal tratamento é tranquilizar os pais, ansiosos por natureza, que ficam muito preocupados em ver o bebê devolvendo o alimento pela boca, e pensam que ele pode estar doente e sofrendo. Os pais devem estar atentos aos sinais de complicação aguda, como os engasgos e sufocação, que são de procura imediata ao serviço médico. Outras alterações serão notadas nas consultas periódicas, que nunca devem ser esquecidas.
As medidas dietéticas orientadas são a manutenção do aleitamento materno (consenso internacional), e nos casos de alimentação artificial, o fracionamento das dietas. Engrossar o leite fica a critério do Pediatra pois em alguns casos este procedimento causa piora dos sintomas, já que o leite engrossado pode se tornar mais difícil de ser digerido. O uso de mamadeira pode aumentar a ingesta de ar, com distensão do estômago, aumentando o refluxo.
As medidas posturais orientadas são a elevação de cabeceira em ângulo de 30 a 45 graus, manter o bebê elevado para arrotar por até 20 minutos, não usar fraldas apertadas por aumentarem a pressão abdominal.
Os medicamentos devem ser utilizados apenas nos casos em que haja suspeita de Doença, devendo ser avaliada pelo Pediatra, individualmente. Nos casos mais complexos, a avaliação do especialista Gastroenterologista Infantil. Em casos raros é necessário procedimento cirúrgico.
Fica claro por tudo isso, que aguardar o amadurecimento é o grande propósito da evolução destes casos, e que cada tratamento apenas ajuda a minimizar sintomas e complicações.


* Dr. Gustavo Baylão Nigre é Gastroenterologista Pediátrico

2 comentários:

  1. Por um acaso esse médico é meu primo!! ^^

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  2. Mary, que coincidência boa! Ele já nos ajudou com ótimos artigos para o blog!

    Abs!

    Equipe Bem-Estar

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